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    O Festim dos Corvos

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    O Festim dos Corvos - Página 17 Empty Re: O Festim dos Corvos

    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:14 pm

    Entretanto, ela não disse essas palavras em voz alta, não enquanto Hyle Hunt
    pudesse ouvi-la e zombar da sua fraqueza de mulher.
    Com o Septão Meribald andando a pé e seu jumento carregando uma
    carga tão pesada, eles andaram devagar por todo o dia. Eles não pegaram o
    caminho principal para oeste, o caminho que Brienne tinha cavalgado com
    Sor Jaime quando foram para Lagoa da Donzela, encontrando-a saqueada e
    cheia de mortos. Ao invés disso, eles tomaram o sentido noroeste, seguindo a
    praia da Baía dos Caranguejos em uma trilha tortuosa que não aparecia em
    nenhum dos preciosos mapas de pele de carneiro de Sor Hyle. As colinas
    íngremes, os pântanos negros e as florestas de pinheiros da Ponta da Garra
    Rachada não podiam ser encontrados daquele lado da Lagoa da Donzela. As
    terras em que eles viajaram eram baixas e molhadas, uma natureza repleta de
    dunas de areia e charcos salgados debaixo de um firmamento cinza-azulado.
    O caminho parecia desaparecer por entre os juncos e poços de maré para
    aparecer de novo uma milha adiante. Brienne pensou que sem Meribald eles
    já estariam perdidos. O chão geralmente era macio, mas mesmo assim o
    septão batia no chão com sua lança para saber os lugares apropriados para
    pisar. Não havia árvores a léguas a frente deles, apenas mar e céu e areia.
    Nenhuma terra poderia ser mais diferente de Tarth, com suas
    montanhas e cachoeiras, seus altos prados e vales escuros, no entanto, o
    lugar tinha sua própria beleza, Brienne pensou. Eles passaram por dúzias de
    córregos com sapos e grilos, viram andorinhas-do-mar voando no céu da
    baía, ouviram os maçaricos chamando das dunas. Uma vez uma raposa
    cruzou o seu caminho e fez o cachorro de Meribald latir selvagemente.
    E havia pessoas também. Algumas viviam entre os juncos em casas
    construídas de barro e palha, enquanto outras pescavam na baía em coracles
    e construíram suas casas em estacas de madeira raquíticas sobre as dunas. A
    maioria parecia viver sozinha, sem qualquer visão de ocupação humana a
    não ser a própria.
    Eles pareciam ser um povo tímido, mas perto do meio-dia o cachorro
    começou a latir novamente, e três mulheres emergiram dos juncos e deram a
    Meribald uma cesta cheia de mariscos. Ele deu a cada uma delas uma laranja
    em retribuição, embora mariscos fossem a coisa mais comum naquele
    mundo, enquanto laranjas eram raras e caras. Uma das mulheres era muita
    velha, outra tinha uma criança pesada no colo. A outra era uma menina tão
    nova e bonita como uma flor de primavera. Quando Meribald começou a
    falar sobre seus pecados, Sor Hyle riu e disse:
    — Parece que os deuses caminhavam conosco... pelo menos a
    Donzela, a Mãe, e a Velha. — Podrick parecia tão atônito que Brienne teve
    que dizer que não, elas só eram três mulheres do pântano.
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    O Festim dos Corvos - Página 17 Empty Re: O Festim dos Corvos

    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:14 pm

    Depois, quando eles recomeçaram a jornada, ela virou-se para o
    septão e disse,
    — Estas pessoas vivem a menos de um dia de viagem de Lagoa da
    Donzela, no entanto a peleja ainda não os tocou.
    — Eles têm pouco para ser tocado, minha senhora. Seus tesouros são
    conchas, pedras e barcos de couro, suas melhores armas são facas
    enferrujadas. Eles nascem, vivem, amam e morrem. Sabem que Lorde
    Mooton governa sobre suas terras, mas poucos o viram e o Rio Corrente e as
    Terras do Rei são apenas nomes para eles.
    — E mesmo assim eles conhecem os deuses — disse Brienne. —
    Esse é seu trabalho, eu acho. Por quanto tempo você andou pelas terras dos
    rios?
    — Logo fará quarenta anos — o septão disse, e seu cachorro deu um
    latido alto. — De Lagoa da Donzela a Lagoa da Donzela, meu circuito dura
    a metade de um ano, às vezes mais, mas não conheço o Tridente. Eu
    vislumbrei os castelos de grandes senhores apenas a uma distância, mas eu
    conheço os mercados das cidades e os refúgios, vilas muito pequenas para
    terem um nome, a mata e as colinas, os regatos de onde um homem sedento
    pode beber e as cavernas onde ele pode se proteger. E as estradas que o povo
    usa, as trilhas tortuosas e lamacentas que não aparecem em mapas de
    pergaminho, eu as conheço também. — Ele riu. — Eu devo. Meus pés
    andaram por cada milha das terras dos rios, e dez vezes mais.
    As estradas de trás são as que os fora da lei usam, e as cavernas um
    bom lugar para eles se esconderem. Um comichão de suspeita fez com que
    Brienne se perguntasse o quão bem Sor Hyle conhecia esse homem.
    — Deve ser uma vida muito solitária, septão.
    — Os Sete estão sempre comigo — disse Meribald, — e eu tenho
    meu servo fiel e meu cachorro.
    — Ele tem nome? — Perguntou Podrick Payne.
    — Deve ter — disse Meribald — mas ele não é meu cachorro. Não
    ele.
    O cachorro latiu e abanou o rabo. Ele era enorme, criatura peluda,
    sessenta quilos no mínimo, mas amigável.
    — A quem ele pertence? Perguntou Podrick Payne.
    — Por quê deveria? A si mesmo, e aos Sete. Quanto ao seu nome,
    ele não me falou qual é. Chamo-o Cachorro.
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:14 pm

    — Oh. — Podrick não sabia o que fazia uma pessoa chamar um
    cachorro de Cachorro. O garoto mastigou o pensamento por um tempo e
    depois disse. Eu tinha um cachorro quando criança. Eu o chamava de Herói.
    — Ele era?
    — Ele era o quê?
    — Um herói.
    — Não. Mas era um bom cachorro. Ele morreu.
    — Cachorro me mantém protegido nas estradas, até mesmo em
    tempos tão difíceis como esses. Nem lobo nem bandido ousa aproximar-se
    de mim quando Cachorro está comigo. — O septão fez uma careta. —
    Ultimamente os lobos se multiplicam terrivelmente. Há lugares em que um
    homem só pode encontrar uma árvore para dormir dentro. Em todos esses
    anos a maior matilha que já vi tinha menos de uma dúzia de lobos, mas a
    matilha que ronda ao longo do Tridente tem quase cem.
    Você os viu? — Sor Hyle perguntou.
    — Fui poupado disso, os Sete me salvaram, mas eu os ouvi à noite
    mais de uma vez. Tantas sons... sons que fazem o sangue de um homem
    coagular. Faz até mesmo Cachorro ter calafrios, e ele matou uma dúzia de
    lobos. — Ele acariciou a cabeça do cachorro. — Algumas pessoas dirão que
    são demônios. Eles dizem que a matilha é liderada por uma loba monstruosa,
    uma sombra perseguidora horrível, cinza, enorme. Eles te dirão que ela é
    conhecida por derrubar bisões sozinha, que nenhuma armadilha ou laço pode
    segurá-la, que não teme nem aço nem fogo, que mata qualquer outro lobo
    que tente tomar seu posto, que não come carne alguma a não ser humana.
    Sor Hyle Hunt riu.
    — Agora você conseguiu, septão. Os olhos do pobre Podrick estão
    tão grandes como ovos cozidos.
    — Não estão — disse Podrick, indignado. Cachorro latiu.
    Naquela noite eles montaram um acampamento frio nas dunas.
    Brienne mandou Podrick ir até à praia encontrar madeira para o fogo, mas
    ele voltou com as mãos vazias, com lama até os joelhos.
    — A maré está baixa, sor. Minha senhora. Não tem água nenhuma,
    apenas alagadiços.
    — Fique longe da lama, filho — aconselhou Septão Meribald. — A
    lama não é gentil com estranhos. Se andar pelos caminhos errados, ela vai se
    abrir e te engolir.
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:14 pm

    — É apenas lama — insistiu Podrick.
    — Até que encha sua boca e comece a entrar em seu nariz. Então, é
    morte. — Ele sorriu para tirar a frieza de suas palavras. — Limpe essa lama
    e coma um pedaço de laranja, rapaz.
    O dia seguinte foi mais do mesmo. Eles quebraram o jejum com
    bacalhau e mais fatias de laranja e tomaram seu rumo antes que o sol tivesse
    nascido completamente, com um céu cor de rosa atrás deles e um céu roxo a
    sua frente. Cachorro guiou-os, farejando cada tufo de junco e parando de vez
    em quando para mijar; ele parecia conhecer a estrada tão bem quanto
    Meribald. O canto das andorinhas-do-mar tremia no ar da manhã enquanto a
    maré subia.
    Perto do meio-dia eles pararam numa pequena vila, a primeira que
    tinham encontrado, onde oito das casas de estaca se erguiam sobre um
    pequeno córrego. Os homens pescavam em seus coracles, mas as mulheres e
    as crianças desceram as escadas de corda e se juntaram ao redor do Septão
    Meribald para rezar. Depois do serviço ele perdoou seus pecados e os deixou
    com alguns nabos, um saco de feijão, e duas de suas preciosas laranjas.
    De volta à estrada, o septão disse.
    — Faríamos bem se fizéssemos turnos de vigia essa noite, meus
    amigos. Os aldeões disseram que viram três homens quebrados se
    escondendo nas dunas, a oeste da velha vigia.
    — Só três? — Sor Hyle sorriu. — Três homens são como mel para
    nossa espadachim. Eles não irão perturbar homens armados.
    — A não ser que estejam morrendo de fome — o septão disse. — Há
    comida nesses brejos, mas apenas para aqueles que têm os olhos para
    encontrá-la, e esses homens são estranhos aqui, sobreviventes de alguma
    batalha. Se eles nos abordarem, sor, deixe-os comigo.
    — O que fará com eles?
    — Os alimentarei. Pedirei para que confessem seus pecados, então
    eu poderei perdoá-los. E os convidarei para irem conosco para a Ilha Quieta.
    — Seria melhor convidá-los para cortar nossas gargantas enquanto
    dormimos — Hyle Hunt replicou. — Lorde Randyll tem outras maneiras de
    lidar com homens quebrados, aço e corda de cânhamo.
    — Sor? Minha senhora? — Disse Podrick. — Um homem quebrado
    é um fora da lei?
    — Mais ou menos — Brienne respondeu.
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:14 pm

    O Septão Meribald discordou.
    — Mas menos do que mais. Há muitas espécies de fora da lei, assim
    como há muitos espécies de pássaros. Um maçarico e uma águia-do-mar têm
    asas, mas não são os mesmos. Os cantores amam cantar sobre homens bons
    forçados a quebrar a lei para lutar contra algum senhor perverso, mas a
    maioria dos foras da lei são mais parecidos com esse Cão voraz do que com
    o Senhor do Relâmpago. Eles são homens maus, guiados pela ganância,
    azedados pela malícia, desprezando os deuses e cuidando apenas de si
    mesmos. Homens quebrados são mais merecedores de nossa pena, embora
    também possam ser perigosos. Quase todos são homens comuns, povo
    simples que nunca esteve a mais de um quilômetro da casa em que nasceram
    até o dia em que algum senhor veio para leva-los para a guerra. Mal calçados
    e mal vestidos, eles marcham para longe dos estandartes, na maioria das
    vezes armadas com nada além de uma foice ou uma enxada afiada, ou uma
    marreta que eles mesmos fizeram, amarrando uma pedra a um pedaço de
    madeira com tiras de couro. Irmãos marcham com irmãos, pais com filhos,
    amigos com amigos. Eles ouviram as canções e as histórias, então eles vão
    com o coração ansioso, sonhando com as maravilhas que verão, da riqueza e
    glória que ganharão. A guerra parece ser uma aventura legal, a maioria deles
    nunca saberá. Então eles sentem o primeiro sabor da batalha. Para alguns, o
    sabor é suficiente para quebrá-los. Outros continuam por anos, até que
    percam a conta de todas as batalhas em que lutaram, mas até mesmo um
    homem que sobreviveu a cem batalhas pode ser quebrado como se a
    centésima fosse a primeira. Irmãos veem irmãos morrerem, pais perdem
    filhos, amigos veem amigos tentando segurar suas entranhas depois de serem
    atingidos por um machado. Eles veem o senhor que os levou para lá cair, e
    algum outro senhor gritar que eles pertencem a ele agora. Eles adquirem uma
    ferida, e quando essa está quase se curando, adquirem outra. Nunca há o
    suficiente para comer, seus sapatos caem aos pedaços na marcha, suas
    roupas estão rasgando e apodrecendo, e metade deles se cagam nas calças
    por beberem água contaminada. Se querem botas novas ou uma capa mais
    quente ou talvez um elmo enferrujado, eles precisam tirá-los de um cadáver,
    e quando caem em si, estão roubando dos vivos também, dos aldeões em
    cujas terras estão lutando, homens bem parecidos com aqueles que
    costumavam ser. Eles matam suas ovelhas e roubam suas galinhas, e depois
    disso é apenas um pequeno passo para que comecem a roubar suas filhas
    também. E um dia eles olham ao redor e percebem que todos os seus amigos
    e parentes se foram, que estão lutando ao lado de estranhos debaixo de um
    estandarte que eles sequer reconhecem mais. Eles não sabem quem são ou
    como voltar para casa, e o senhor para quem estão lutando não sabe seus
    nomes, mesmo assim ele vem, gritando para que eles fiquem em sentido,
    para que formem uma linha com suas lanças e foices e enxadas afiadas, para
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:15 pm

    defender a posição. E os cavaleiros vêm até eles, homens sem face vestidos
    em aço, e o trovão de ferro que carregam parece encher o mundo... e o
    homem se quebra. Ele volta e corre, ou engatinha sobre os cadáveres da
    matança, ou roubam na escuridão da noite, e ele encontra algum lugar para
    se esconder. Todo pensamento sobre seu lar já se foi, e reis e senhores e
    deuses significam menos do que uma coxa de carne estragada que o deixará
    vivo por mais um dia, ou um odre de vinho ruim que poderá afogar seu
    medo por algumas horas. O homem quebrado vive dia a dia, de refeição a
    refeição, mais fera do que homem. A Senhora Brienne não está errada. Em
    tempos como esse, o viajante deve estar atento a homens quebrados, e temêlos...
    mas deve sentir pena deles também.
    Quando Meribald terminou, um silêncio profundo desceu sobre o
    grupo. Brienne podia ouvir o vento murmurando em uma moita de salgueiro
    e ao longe o débil som de uma gavia. Ela podia ouvir Cachorro arquejando
    suavemente enquanto trotava ao lado do septão e seu jumento, com a língua
    pra fora da boca. O silêncio se estendeu e se estendeu, até que finalmente ela
    disse.
    — Quantos anos você tinha quando eles te enviaram para a guerra?
    — Ora, quando era mais novo do que seu menino — Meribald
    replicou. — Muito novo para tal coisa, de fato, mas meus irmãos todos
    estavam indo, e eu não seria deixado para trás. Willam disse que eu poderia
    ser seu escudeiro, embora ele não fosse nenhum cavaleiro, apenas um
    garçom de taverna armado com uma faca de cozinha que roubou da
    estalagem. Ele morreu nos Degraus de Pedra, sem acertar um golpe. A febre
    o levou, assim como a meu irmão Robin. Owen morreu quando uma clava
    acertou e quebrou sua cabeça, e seu amigo Jon Pox foi enforcado por
    estupro.
    — A Guerra dos Reis de Nove Centavos? — Perguntou Hyle Hunt.
    — Assim a chamam, embora eu nunca tenha visto um rei, ou
    ganhado um centavo. Mas foi uma guerra. Aquilo foi uma guerra.
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:15 pm

    Samwell 454


    Sam estava em pé diante da janela, balançando nervosamente,
    enquanto observava a última luz do sol desaparecer atrás de uma
    fileira de telhas pontiagudas. Ele deve ter ficado bêbado de novo,
    pensou melancolicamente. Ou então ele conheceu outra garota. Ele não
    sabia se praguejava ou chorava. Dareon era para ser seu irmão. Peça-lhe
    para cantar, e ninguém poderá ser melhor. Peça-lhe para fazer qualquer
    outra coisa...
    As névoas da noite tinham começado a subir, enviando dedos cinza
    sobre as paredes dos edifícios que ladeavam o velho canal.
    — Ele prometeu que estaria de volta — disse Sam. — Você o ouviu
    também.
    Goiva olhou para ele com os olhos avermelhados e inchados. Os
    cabelos sujos e embaraçados caíam sobre seu rosto. Ela parecia um animal
    cauteloso olhando através de um arbusto. Haviam se passado dias desde que
    eles tinham acendido uma fogueira, mas a menina selvagem gostava de se
    aconchegar perto da lareira, como se as cinzas frias ainda tivessem um pouco
    de calor restante.
    — Ele não gosta de ficar aqui conosco — disse ela, sussurrando para
    não acordar o bebê. — É triste aqui. Ele gosta de ficar onde há vinho e
    sorrisos.
    Sim, pensou Sam, e o vinho está em toda parte menos aqui. Bravos
    estava cheia de estalagens, tavernas e bordéis. E se Dareon preferiu uma
    fogueira e uma taça de vinho quente ao invés de pão amanhecido e
    companhia de uma mulher chorosa, um glutão covarde e um velho doente,
    quem poderia culpá-lo? Eu poderia culpá-lo. Ele disse que estaria de volta
    antes do crepúsculo, ele disse que iria nos trazer vinho e comida.
    Ele olhou pela janela mais uma vez, alimentando a esperança de ver
    o cantor correndo para casa. A escuridão estava caindo na cidade secreta,
    arrastando-se pelos becos e descendo pelos canais. O bom povo de Bravos
    logo estaria fechando as janelas e trancando as suas portas. A noite pertencia
    aos bravos e as prostitutas.
    Os novos amigos de Dareon, Sam pensou amargamente. O cantor só
    falava deles ultimamente. Ele estava tentando escrever uma canção sobre
    uma prostituta, uma mulher chamada de Sombra da Lua, que o tinha ouvido
    cantar ao lado do Lago da Lua e o recompensou com um beijo.
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:15 pm

    — Você deveria ter pedido prata para ela — Sam disse. — É de
    moedas que precisamos, não de beijos. — Mas o cantor apenas sorriu. —
    Alguns beijos valem mais que ouro amarelo, Matador.
    Aquilo o irritou também. Dareon não deveria estar compondo
    canções sobre prostitutas. Ele deveria estar cantando sobre a Muralha e o
    valor da Patrulha da Noite. Jon tinha esperança de que talvez suas canções
    pudessem convencer alguns jovens a vestir o negro. Em vez disso, ele cantou
    sobre beijos dourados, cabelos prateados e lábios vermelhos. Ninguém nunca
    vestiria o negro por causa de lábios vermelhos.
    Às vezes, ao tocar ele acordava a criança também. Então a criança
    começava a chorar. Dareon gritava para ela ficar quieta, Goiva chorava, e o
    cantor se enfurecia, saía e não voltava por dias.
    — Toda essa choradeira me faz querer dar um tapa nela — ele
    reclamou: — E eu mal posso dormir quando ela soluça.
    Você iria chorar também se tivesse um filho e o perdesse, Sam quase
    disse. Ele não podia culpar Goiva por seu lamento. Em vez disso, ele culpou
    Jon Snow e se perguntou quando o coração de Jon tinha se transformado em
    pedra. Uma vez ele fez a Meistre Aemon essa mesma pergunta, quando
    Goiva foi para o canal buscar água para eles.
    — No momento em que você o elevou como senhor comandante —
    respondeu o velho.
    Mesmo agora, apodrecendo na sala fria sob o beiral do telhado, parte
    de Sam não queria acreditar que Jon tinha feito o que o Meistre Aemon
    pensava. Deve ser verdade, no entanto. Por que mais Goiva choraria tanto?
    Tudo o que ele tinha que fazer era perguntar-lhe de quem era criança que ela
    estava amamentando, mas ele não teve coragem. Ele estava com medo da
    resposta que poderia receber. Eu ainda sou um covarde, Jon. Não importa
    onde ele fosse neste mundo, seus medos iriam com ele.
    Um estrondo oco ecoou pelos os telhados de Bravos, como o som de
    um trovão distante. O Titã, soando como o cair da noite do outro lado da
    lagoa. O barulho foi alto o suficiente para acordar o bebê, e seu choro
    repentino acordou Meistre Aemon. Enquanto Goiva foi dar o peito ao
    menino, os olhos do velho se abriram, e ele se mexeu debilmente em sua
    cama estreita.
    — Egg? Está escuro. Por que está tão escuro?
    Porque você é cego. A sanidade de Aemon estava diminuindo mais e
    mais desde que chegaram a Bravos. Alguns dias ele não parecia saber onde
    estava. Alguns dias ele se perdia ao dizer alguma coisa e começava a divagar
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:16 pm

    sobre seu pai ou seu irmão. Ele tem cento e dois anos, Sam lembrou a si
    mesmo, mas ele também era velho em Castelo Negro e sua sanidade nunca
    tinha se perdido por lá.
    — Sou eu — ele tinha que dizer. — Samwell Tarly. O seu
    intendente.
    — Sam — Meistre Aemon lambeu os lábios, e piscou. — Sim. E
    aqui é Bravos. Perdoe-me, Sam. A manhã chegou?
    — Não. — Sam sentiu a testa do velho. Sua pele estava úmida de
    suor, fria e úmida ao toque, sua respiração era um chiado suave. — É noite,
    Meistre. Você estava dormindo.
    — Por muito tempo. Está frio aqui dentro.
    — Nós não temos madeira — Sam disse a ele — e o estalajadeiro
    não nos dará mais se não tivermos moeda. — Foi a quarta ou quinta vez que
    eles tiveram essa mesma conversa. Eu deveria ter usado a nossa moeda para
    madeira, Sam repreendia-se o tempo todo. Eu deveria ter tido o bom senso
    de mantê-lo aquecido.
    Ao contrário, ele havia desperdiçado a última de sua prata em um
    curandeiro da Casa das Mãos Vermelhas, um homem alto, pálido com vestes
    bordadas com listras vermelhas e brancas em espiral. Tudo o que a prata
    comprou-lhe foi meio frasco de vinho dos sonhos.
    — Isso pode suavizar a sua morte — o bravosiano tinha dito, mas
    não de maneira indelicada. Quando Sam perguntou se não havia mais nada
    que ele pudesse fazer, ele balançou a cabeça. — Pomadas eu tenho, poções e
    infusões, tinturas, venenos e cataplasmas. Eu poderia sangrá-lo, purificá-lo,
    aplicar sanguessugas... mas por quê? Nenhuma sanguessuga pode fazê-lo ser
    jovem outra vez. Este é um homem velho, e a morte está em seus pulmões.
    Dê-lhe isto e deixe-o dormir.
    E assim ele fez toda noite e todo o dia, mas agora o velho estava se
    esforçando para se sentar.
    — Devemos ir até os navios.
    Os navios novamente.
    — Você está fraco demais para sair — ele teve que dizer. Meistre
    Aemon teve durante a viagem um calafrio que se instalou em seu peito. No
    momento em que eles chegaram a Bravos ele tinha ficado tão fraco que
    tiveram que carregá-lo em terra. Eles ainda tinham uma gorda bolsa de prata
    até então, de modo que Dareon pediu a maior cama da estalagem. A cama
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:16 pm

    que eles tinham no início era grande o suficiente para dormir oito pessoas, de
    modo que o estalajadeiro insistiu em cobrá-los como se eles fossem oito.
    — No dia seguinte nós podemos ir para as docas — Sam prometeu.
    — Vamos sair perguntando e descobrir qual é o próximo navio que parte
    para Vilavelha. — Mesmo no outono, Bravos ainda era um porto
    movimentado. Assim que Aemon estivesse forte o suficiente para viajar, eles
    não deveriam ter problemas para encontrar um navio adequado para levá-los
    onde eles tinham que ir. Pagar pelas suas passagens se mostraria mais difícil.
    Um navio dos Sete Reinos seria a sua melhor esperança. Um comerciante de
    Vilavelha, talvez, com parentes na Patrulha da Noite. Ainda deve haver
    alguns que honram os homens que andam sobre a Muralha.
    — Vilavelha — Meistre Aemon resfolegou. — Sim. Eu sonhei com
    Vilavelha, Sam. Eu era jovem novamente e meu irmão Egg estava comigo,
    com aquele cavaleiro grande que servia. Estávamos bebendo na velha
    estalagem, onde eles fazem a sidra assustadoramente forte. — Ele tentou
    levantar novamente, mas o esforço foi demais para ele. Depois de um
    momento ele se acomodou. — Os navios — disse ele novamente. — Nós
    vamos encontrar a nossa resposta lá. Sobre os dragões. Eu preciso saber.
    Não, pensou Sam, é de alimento e calor que você precisa, de uma
    barriga cheia e um fogo crepitante na lareira quente.
    — Você está com fome, meistre? Temos algum pão restante e um
    pouco de queijo.
    — Não agora, Sam. Mais tarde, quando eu estiver me sentindo mais
    forte.
    — Como é que vai ficar mais forte se você não come? — Nenhum
    deles tinha comido muito no mar, não depois de Skagos. Os ventos do
    outono haviam os perseguido através de todo o mar estreito. Às vezes, eles
    subiam do sul, agitando com raios e trovões e chuvas negras que caíram por
    dias. Às vezes, eles desciam do norte, frios e sombrios, com ventos brutais
    que açoitavam os homens. Uma vez eles ficaram tão frios que Sam acordou
    e encontrou o navio todo revestido em gelo brilhante e branco como pérola.
    O capitão abaixou seu mastro e amarrou-o no convés para concluir sozinho a
    travessia a remo. Ninguém tinha comido enquanto eles viam o Titã.
    Entretanto, uma vez seguro em terra, Sam descobriu que estava
    faminto. Foi o mesmo para Dareon e Goiva. Até o bebê começou a chupar
    mais vigorosamente. No entanto, Aemon...
    — O pão envelheceu, mas eu posso pedir algum caldo das cozinhas
    para embebê-lo — Sam dissera ao velho. O estalajadeiro era um homem
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:16 pm

    duro, com olhos frios e desconfiados com esses estranhos vestidos de preto
    sob o seu teto, mas seu cozinheiro era gentil.
    — Não. Mas talvez um gole de vinho?
    Eles não tinham vinho. Dareon tinha prometido comprar com a
    moeda de seu canto.
    — Nós vamos ter o vinho mais tarde — Sam teve que dizer. —
    Temos água, mas não é água boa. — A água boa chegava ao longo dos
    arcos do grande aqueduto de tijolos bravosianos chamado o rio Água Doce.
    Homens ricos a tinham encanada em suas casas; os pobres enchiam os
    baldes e bacias de fontes públicas. Sam tinha enviado Goiva para fora para
    encher alguns, esquecendo que a menina selvagem tinha vivido toda a sua
    vida sob a vista da Fortaleza de Craster e nunca tinha vistonada parecido a
    uma cidade mercantil. O labirinto de ilhas de pedras e canais que era Bravos,
    desprovido de grama e árvores e repleta de estranhos que falavam com ela
    em palavras que ela não conseguia entender a assustava tanto que ela perdeu
    o mapa e logo se perdeu também. Sam encontrou-a chorando aos pés de
    pedra de algum Senhor do Mar morto há tempos. — Tudo o que temos é a
    água do canal — disse ele a Meistre Aemon, mas a cozinheira a ferveu. Há
    vinho dos sonhos também, se você precisar mais disso.
    — Eu sonhei o suficiente por enquanto. Água do canal será
    suficiente. Ajude-me, se quiser.
    Sam ajudou velho a se levantar e segurou o copo até os seus lábios
    secos e rachados. Mesmo assim, metade da água escorreu pelo peito do
    Meistre.
    — Basta — Aemon tossiu, depois de alguns goles. — Você vai me
    afogar. Estremeceu nos braços de Sam. — Por que o quarto está tão frio?
    — Não há mais madeira. — Dareon havia pagado o dobro para o
    estalajadeiro por um quarto com uma lareira, mas nenhum deles havia
    percebido que a madeira seria tão cara aqui. Árvores não cresciam em
    Bravos, salvo nas cortes e jardins dos poderosos. Também os bravosianos
    não cortavam os pinheiros que cobriam as ilhas periféricas em torno de sua
    grande lagoa e que funcionavam como quebra-ventos para protegê-los das
    tempestades. Em vez disso, a lenha era trazida em barcaças, pelos rios e
    através da lagoa. Até esterco era estimado por lá. Os bravosianos usavam
    barcos no lugar de cavalos. Nada disso teria importância se eles tivessem
    partido como o planejado para Vilavelha, mas isso se tornou impossível com
    Meistre Aemon tão fraco. Outra viagem em mar aberto iria matá-lo.
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:16 pm

    A mão de Aemon se arrastou pelos cobertores, tateando para
    encontrar o braço de Sam.
    — Temos de ir para as docas, Sam.
    — Quando você estiver mais forte. — O velho não estava em
    condições para enfrentar a rajada de sal e os ventos úmidos ao longo da orla,
    e Bravos era todo mar. Ao norte ficava Porto Roxo, onde os comerciantes
    bravosianos amarravam suas embarcações debaixo das cúpulas e torres do
    Palácio do Senhor do Mar. A oeste se encontrava o Porto de Ragman, repleto
    de navios de outras Cidades Livres, de Westeros e Ibben e das lendárias
    terras distantes do Oriente. E todos os outros lugares eram pequenos píers e
    atracadores para balsas e cais velhos cinzentos onde pescadores de camarões,
    caranguejeiros e pescadores atracavam depois de trabalhar nos lamaçais e
    nos rios. — Seria uma pressão muito grande sobre você.
    — Então vá em meu lugar — Aemon pediu, — e me traga alguém
    que tenha visto esses dragões.
    — Eu? — Sam estava desanimado com a sugestão. — Meistre, foi
    apenas uma história. História de um marinheiro. — Dareon era o culpado
    por isso também. O cantor tinha trazido de volta todos os tipos de contos
    estranhos das tavernas e bordéis. Infelizmente, ele estava bêbado quando
    ouviu aquela sobre os dragões e não conseguia se lembrar dos detalhes. —
    Dareon pode ter inventado a história toda. Cantores fazem isso. Eles
    inventam coisas.
    — Eles inventam — disse Meistre Aemon, — mas mesmo a música
    mais fantasiosa podem ter um fundo de verdade. Procure a verdade para
    mim, Sam.
    — Eu não saberia a quem perguntar, ou a forma de perguntar. Eu só
    falo um pouco de valiriano e quando eles falam comigo em bravosiano eu
    não consigo entender metade do que eles estão dizendo. Você fala mais
    línguas do que eu, assim que você estiver mais forte você pode...
    — Quando eu ficarei mais forte, Sam? Diga-me quando.
    —Em breve. Se você descansar e comer. Quando alcançarmos
    Vilavelha...
    — Não verei Vilavelha novamente. Eu sei disso agora. — O velho
    apertou o braço de Sam. — Eu estarei com meus irmãos em breve. Alguns
    eu ganhei por votos e outros por sangue, mas eram todos os meus irmãos. E
    meu pai... ele nunca pensou que o trono passaria para ele, e mesmo assim ele
    assumiu. Ele costumava dizer que era o seu castigo pelo golpe que matou
    seu irmão. Eu rezo para que ele tenha encontrado a paz na morte que ele
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:17 pm

    nunca conheceu na vida. Os septões cantam sobre o fim agradável, sobre
    deixar os nossos fardos e viajar para uma terra muito agradável onde
    podemos rir e amar e festejar até o fim dos dias... mas e se não houver terra
    de luz e mel, só frio e escuridão e dor além da Muralha chamada morte?
    Ele tem medo, Sam percebeu.
    — Você não está morrendo. Você está doente, é só isso. Isso vai
    passar.
    — Não desta vez, Sam. Eu sonhei... na escuridão da noite, um
    homem faz todas as perguntas que ele não ousa fazer de dia. Para mim,
    nestes últimos anos, me restou apenas uma pergunta. Por que os deuses
    tirariam minha visão e minha força ainda que me condenassem a permanecer
    vivo por tanto tempo, congelado e esquecido? Que uso eles poderiam ter
    para um velho como eu? — Os dedos de Aemon tremeram, galhos revestidos
    de pele manchada. — Eu me lembro, Sam. Eu ainda me lembro.
    Ele não estava fazendo sentido.
    — Do que você se lembra?
    — Dragões — Aemon sussurrou. — Eles foram a dor e a glória de
    minha casa.
    — O último dragão morreu antes de você nascer — disse Sam. —
    Como é que você se lembra deles?
    — Eu os vejo em meus sonhos, Sam. Eu vejo uma estrela vermelha
    sangrando no céu. Ainda me lembro do vermelho. Eu vejo suas sombras na
    neve, ouço o estalo de asas de couro, sinto sua respiração quente. Meus
    irmãos também sonharam com dragões e os sonhos os mataram, cada um
    deles. Sam, nós estremecemos à proximidade de profecias mal lembradas, de
    maravilhas e terrores que nenhum homem vivo poderia esperar
    compreender... ou...
    — Ou? — Disse Sam.
    —... ou não. — Aemon riu baixinho. — Ou eu sou um homem
    velho, febril e morrendo. — Fechou os olhos brancos cansado, então os
    forçou a se abrirem mais uma vez. — Eu não deveria ter deixado a Muralha.
    Lorde Snow não poderia saber, mas eu deveria ter visto. Fogo consome, mas
    o fio preserva. A Muralha... mas é tarde demais para voltar atrás. O Estranho
    espera do lado de fora da minha porta e não isso não lhe será negado.
    Intendente, você tem me servido fielmente. Faça uma última coisa corajosa
    por mim. Vá até os navios, Sam. Aprenda tudo o que puder sobre esses
    dragões.
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:17 pm

    Sam colocou seu braço fora do alcance do velho.
    — Eu vou. Se você deseja. Eu só... — Ele não sabia mais o que
    dizer. Eu não posso recusá-lo. Ele poderia procurar por Dareon também, ao
    longo das docas e cais do porto de Ragman. Eu encontrarei Dareon
    primeiro, e vamos juntos para os navios. E quando voltarmos nós vamos
    trazer comida, vinho e madeira. Teremos uma fogueira e uma boa refeição
    quente. Ele se levantou. — Bem. Eu deveria ir, então. Se eu estou indo,
    Goiva ficará. Goiva, tranque a porta quando eu me for. — O Estranho
    espera do lado de fora da porta.
    Goiva balançou a cabeça, embalando o bebê contra seu peito, com os
    olhos cheios de lágrimas a brotar. Ela vai chorar de novo, Sam percebeu. Foi
    mais do que ele podia aguentar. Seu cinturão pendia em uma estaca na
    parede, ao lado dos cornos velhos e quebrados que Jon lhe dera. Ele arrancou
    o cinturão e o vestiu, então varreu a sua capa de lã negra sobre os ombros
    arredondados, saiu pela porta e desceu por uma escada de madeira cujos
    degraus rangeram sob seu peso. A estalagem tinha duas portas da frente,
    uma saindo em uma rua e outra em um canal. Sam saiu pela última, para
    evitar a sala comum, onde o estalajadeiro com certeza lhe daria o olhar
    azedo que ele reservara para os clientes que abusavam da sua hospitalidade.
    Havia um frio no ar, mas a noite não era tão nebulosa quanto outras.
    Sam estava muito grato por isso. Às vezes a névoa cobria tanto o chão que
    um homem não podia ver seus próprios pés. Isto era bom uma vez que ele
    estaria a um passo de cair em um canal.
    Quando menino Sam tinha lido uma história de Bravos e sonhava em
    um dia ir para lá. Queria contemplar o Titã crescendo severo e temível pelo
    mar, deslizar pelos canais em um barco serpente passando por todos os
    palácios e templos, e ver Bravos fazer sua dança da água, lâminas piscando
    sob a luz das estrelas. Mas agora que ele estava aqui, tudo que ele queria era
    sair e ir a Vilavelha.
    Com seu capuz levantado e seu manto balançando ele fez o seu
    caminho ao longo da calçada em direção ao Porto de Ragman. Seu cinturão
    continuava ameaçando cair sobre os tornozelos, então ele tinha que continuar
    puxando de volta para cima. Ele ficou nas menores e mais escuras ruas, onde
    era menos provável encontrar alguém, mas cada gato que passava ainda fazia
    seu coração disparar... Bravos estava cheia de gatos. Eu preciso encontrar
    Dareon, pensou. Ele é um homem da Patrulha da Noite, meu irmão
    juramentado; eu e ele vamos descobrir o que fazer. A força de Meistre
    Aemon se foi, e Goiva teria se perdido aqui, mesmo se ela não estivesse tão
    angustiada, mas Dareon... Eu não deveria pensar mal dele. Ele pode estar
    ferido, talvez seja por isso que ele não voltou. Ele poderia estar morto,
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:17 pm

    deitado em algum beco em uma poça de sangue, ou flutuando de bruços em
    um dos canais. À noite, os bravos gabavam-se pela cidade em suas melhores
    roupas multicoloridas, saqueando para provar suas habilidades com as
    espadas finas que usavam. Alguns poderiam lutar por qualquer causa, outros
    por nenhuma, e Dareon tinha uma língua solta e um temperamento
    explosivo, especialmente quando ele bebia. Só porque um homem pode
    cantar sobre batalhas não significa que ele pode lutar em uma.
    A melhores tavernas, estalagem e bordéis estavam perto de Porto
    Roxo ou do Lago da Lua, mas Dareon preferia o porto de Ragman, onde os
    clientes eram mais aptos a falar a língua comum. Sam começou sua busca na
    estalagem da Enguia Verde, no Barqueiro Negro e na Estalagem do
    Moroggo, lugares onde Dareon tinha jogado antes. Ele não foi encontrado
    em qualquer uma delas. Do lado de fora da Casa da Névoa vários barcos
    serpente estavam amarrados aguardando seus capitães, e Sam tentou
    perguntar aos barqueiros se tinham visto um cantor todo de preto, mas
    nenhum dos barqueiros entendeu seu Alto Valiriano. Ou então eles
    preferiram não entender. Sam olhou para o sombrio bar abaixo do segundo
    arco da ponte de Nabbo, apenas grande o suficiente para acomodar dez
    pessoas. Dareon não era um deles. Ele tentou a Taverna do Exilado, a Casa
    dos Sete Candeeiros, e o bordel chamado Gatil, onde ele obteve olhares
    estranhos, mas não obteve ajuda.
    Saindo, ele quase colidiu com dois jovens sob a lanterna vermelha
    do Gatil. Um era negro e o outro era louro. O de cabelos escuros disse algo
    em Bravosiano.
    — Eu sinto muito — Sam teve que dizer. — Eu não entendo. — Ele
    se afastou deles, com medo. Nos Sete Reinos os nobres vestem-se em
    veludos, sedas, e samites de uma centena de tons, enquanto os camponeses e
    pessoas sem importância usavam lã crua e seda de fios grossos e de cores
    apagadas. Em Bravos era o contrário. Os bravosianos se vangloriavam como
    pavões, dedilhando suas espadas, enquanto os poderosos andavam vestidos
    de cinza-carvão e roxo, azuis que eram quase pretos e negros tão escuros
    como uma noite sem lua.
    — Meu amigo Terro diz que você é tão gordo que deixa ele com
    nojo — disse o bravosiano louro, cuja capa era de veludo verde de um lado e
    pano-de-prata do outro. — Meu amigo Terro diz que o chocalho de sua
    espada faz a cabeça dele doer. — Ele estava falando no Idioma Comum. O
    outro, o bravosiano de cabelo preto com sua capa de brocado cor de vinho e
    amarelo, cujo nome parecia ser Terro, fez um comentário em bravosiano, e
    seu amigo loiro riu e disse:
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:17 pm

    — Meu amigo Terro diz que você está vestido acima da sua posição.
    Você é algum grande senhor para usar o preto?
    Sam queria correr, mas se ele fizesse isso tropeçaria em seu próprio
    cinturão. Não toque em sua espada, ele disse a si mesmo. Até mesmo um
    dedo no punho pode ser suficiente para um dos bravosianos tomar como um
    desafio. Tentou pensar em palavras que poderiam apaziguá-los.
    — Eu não sou — foi tudo que ele conseguiu.
    — Ele não é um senhor — a voz de uma criança se intrometeu. —
    Ele é da Patrulha da Noite, estúpido. De Westeros. — Uma menina surgiu
    sob a luz, empurrando um carrinho de mão cheio de algas, uma criatura
    desajeitada e magricela com botas grandes, com cabelos sujos e mal lavados.
    — E há outro para os lados do Porto Feliz, cantando canções para a Esposa
    do Marinheiro, — ela informou aos dois bravosianos. Para Sam, ela disse: —
    Se eles perguntam quem é a mulher mais bonita do mundo, diga Rouxinol ou
    então eles vão desafiá-lo. Você quer comprar alguns mariscos? Vendi todas
    as minhas ostras.
    — Eu não tenho nenhuma moeda — disse Sam.
    — Ele não tem moeda — zombou o bravo louro. Seu amigo de
    cabelos escuros sorriu e disse algo em Bravosiano. — Meu amigo Terro está
    com frio. Seja nosso bom amigo gordo e dê-lhe o seu manto.
    — Não faça isso também — disse a garota do carrinho de mão —
    ou então eles vão pedir suas botas em seguida e em pouco tempo você estará
    nu.
    — Gatos pequenos que miam muito alto acabam se afogando nos
    canais, alertou o bravosiano louro.
    — Não se ele tem garras. — E de repente havia uma faca na mão
    esquerda da menina, uma lâmina tão fina quanto ela. O bravosiano chamado
    Terro disse algo ao seu amigo de cabelos louros e os dois se afastaram, rindo
    um para o outro.
    — Obrigado — Sam disse para a menina quando eles foram
    embora.
    Sua faca desapareceu. — Se você usar uma espada durante a noite isso
    significa que você pode ser desafiado. Você queria lutar contra eles?
    — Não. — A palavra saiu em um guincho que fez Sam corar.
    — Você é realmente da Patrulha da Noite? Eu nunca vi um irmão
    negro como você antes. — A menina apontou para o carrinho de mão. —
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:18 pm

    Você pode ficar com os últimos mariscos se você quiser. Está escuro,
    ninguém vai comprá-los agora. Você está navegando para a Muralha?
    — Para Vilavelha. — Sam pegou um dos mariscos cozidos e o
    devorou. — Estamos entre navios. — O marisco estava bom. Ele comeu o
    outro.
    —Os bravosianos nunca incomodam ninguém sem uma espada.
    Nem mesmo merdas de camelo estúpidos como Terro e Orbelo.
    — Quem é você?
    — Ninguém. — Ela fedia a peixe. — Eu costumava ser alguém, mas
    agora eu não sou. Você pode me chamar de Cat, se quiser. Quem é você?
    — Samwell, da Casa Tarly. Você fala a língua comum.
    — Meu pai era o mestre dos remos no Nymeria. Um bravosiano o
    matou por ele dizer que minha mãe era mais bonita que a Rouxinol. Não um
    daqueles merdas de camelo que você conheceu, um bravosiano de verdade.
    Algum dia eu vou cortar sua garganta. O capitão disse que o Nymeria não
    precisava de garotinhas, por isso ele me expulsou. Brusco me acolheu e me
    deu um carrinho de mão. — Ela olhou para ele. — Em qual navio vocês está
    navegando?
    — Compramos a passagem na Senhora Ushanora.
    A garota olhou para ele com desconfiança.
    — Ela se foi. Você não sabe? Ela zarpou há dias e dias atrás.
    Eu sei, Sam poderia ter dito. Ele e Dareon tinham ficado no cais
    assistindo a subida e descida de seus remos à medida que ela rumou para o
    mar aberto.
    — Bem — o cantor dissera. — Já era. — Se Sam tivesse sido um
    homem corajoso, ele teria o empurrado na água. Quando o assunto era
    mulheres sem roupas, Dareon tinha uma língua doce, ainda na cabine do
    capitão de alguma forma Sam tinha falado, tentando convencer o Bravosiano
    a esperar por eles.
    — Já faz três dias que eu espero por esse velho — o capitão tinha
    dito. — Minhas celas estão cheias e os meus homens já deram suas fodidas
    de despedida com as suas esposas. Com ou sem você a minha Senhora vai
    embora na maré.
    — Por favor — Sam implorou. — Só mais alguns dias, isso é tudo
    que eu peço. Então Meistre Aemon pode recuperar sua força.
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:18 pm

    — Ele não tem força. — O capitão havia o visitado na estalagem na
    noite anterior para ver Meistre Aemon por conta própria. — Ele está velho e
    doente e eu não vou vê-lo morrer na minha Senhora. Fique com ele ou
    deixe-o, não importa para mim. Eu vou embora.
    Pior ainda, ele se recusou a devolver o dinheiro que haviam pagado
    pela passagem, a prata que serviria para leva-los em segurança até Vilavelha.
    — Você comprou a minha melhor cabine. Ela está lá, esperando por
    você. Se você escolheu não ocupá-la isso não é culpa minha. Por que eu
    deveria arcar com a perda?
    Agora poderíamos estar em Valdocaso, Sam pensou
    melancolicamente. Poderíamos até ter chegado à Pentos, se os ventos
    fossem bons.
    Mas nada disso teria importância para a garota do carrinho de mão.
    — Você disse que viu um cantor ...
    — Em Porto Feliz. Ele vai se casar com a esposa do marinheiro.
    — Casar?
    — Ela só se deita com os que se casam com ela.
    — Onde fica este Porto Feliz?
    — Na direção do Navio do Mascarado. Eu posso te mostrar o
    caminho.
    — Eu sei o caminho. — Sam tinha visto o Navio do Mascarado.
    Dareon não pode casar! Ele fez o juramento! — Eu tenho que ir.
    Ele correu. Foi um longo caminho sobre pedras lisas. Em pouco
    tempo ele estava ofegante, seu grande manto preto batendo ruidosamente
    atrás de si. Ele tinha que manter uma mão em seu cinturão enquanto corria.
    As poucas pessoas que ele encontrou deram-lhe olhares curiosos, e de vez
    um quando um gato se eriçava e silvava para ele. Quando ele atingiu o navio
    estava cambaleando. Porto Feliz ficava apenas do outro lado do beco.
    Logo quando ele entrou, corado e sem fôlego, uma mulher de um
    olho só jogou os braços ao redor de seu pescoço.
    — Não — Sam disse a ela. — Eu não estou aqui para isso. — Ela
    respondeu em Bravosiano. — Eu não falo essa língua — Sam disse em Alto
    Valiriano. Havia velas acesas e um fogo crepitante na lareira. Alguém estava
    tocando um violino e então ele viu duas meninas dançando em torno de um
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:18 pm

    feiticeiro vermelho, de mãos dadas. A mulher de um olho só pressionou os
    seios contra o seu peito. — Não faça isso! Eu não estou aqui para isso!
    — Sam! — A voz familiar Dareon ecoou. — Yna, deixe-o ir, este é
    o Sam, o Matador. Meu irmão juramentado!
    A mulher de um olho só se despiu ainda mantendo uma mão em seu
    braço. Um dos dançarinos gritou:
    — Ele pode me matar se quiser — e o outro disse:
    — Você acha que ele me deixa tocar sua espada? — Atrás deles,
    uma galé púrpura tinha sido pintada na parede, tripulado por mulheres
    vestindo botas altas e nada mais. Um marinheiro Tyroshi estava desmaiado
    em um canto, ressonando em sua enorme barba escarlate. Noutro canto uma
    mulher mais velha com seios enormes estava jogando com um enorme
    homem das Ilhas do Verão vestido com penas pretas e escarlates. No meio
    de tudo isso Dareon estava sentado, acomodando o pescoço da mulher em
    seu colo. Ela estava vestindo sua capa preta.
    — Matador — o cantor o chamou, bêbado. Venha conhecer minha
    esposa. — Seu cabelo era de areia e mel, seu sorriso caloroso. — Eu cantei
    minhas canções de amor. As mulheres se derretem como manteiga quando
    eu canto. Como eu poderia resistir a este rosto? — Ele beijou seu nariz. —
    Mulher, dê um beijo no Matador, ele é meu irmão. — Quando a menina se
    levantou, Sam viu que ela estava nua por baixo do manto. — Não vá
    acariciar minha esposa agora, Matador. — Disse Dareon, rindo. — Mas se
    você quiser uma de suas irmãs, fique a vontade. Eu ainda tenho bastante
    moeda, eu acho.
    Moeda que poderia ter nos comprado comida, Sam pensou, moeda
    que poderia ter comprado madeira, de modo Meistre Aemon poderia se
    manter aquecido.
    — O que você fez? Você não pode se casar. Você fez o juramento, o
    mesmo que eu. Eles poderiam cortar sua cabeça por isso.
    — Nós estamos casados só por esta noite, Matador. Mesmo em
    Westeros ninguém perde a cabeça por isso. Você nunca foi para a Vila
    Toupeira cavar um tesouro enterrado?
    — Não. Sam corou. — Eu nunca...
    — E quanto a sua puta selvagem? Você deve ter fodido ela uma vez
    ou três. Todas aquelas noites na mata, amontoados sob o seu manto, não me
    diga que você nunca enfiou nela. — Ele acenou com a mão em direção a
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    O Festim dos Corvos - Página 17 Empty Re: O Festim dos Corvos

    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:18 pm

    uma cadeira. — Sente-se, Matador. Tome um copo de vinho. Pegue uma
    puta. Pegue os dois.
    Sam não queria um copo de vinho.
    — Você prometeu voltar antes do crepúsculo. Para trazer de volta
    vinho e comida.
    — Foi assim que matou aquele Outro? Ralhando com ele até a
    morte? — Dareon riu. — Ela é minha mulher, não você. Se você não vai
    beber no meu casamento então vá embora.
    — Venha comigo — disse Sam. — Meistre Aemon acordou e quer
    ouvir sobre esses dragões. Ele está falando de estrelas sangrando e sombras
    brancas e sonhos e... se pudéssemos descobrir mais sobre esses dragões, isso
    poderia ajudar a amenizar as coisas para ele. Ajude-me.
    — Amanhã. Não na minha noite de núpcias. — Dareon levantou-se,
    levou sua noiva pela mão, e começou a andar em direção à escada, puxandoa
    atrás dele.
    Sam bloqueou seu caminho.
    — Você prometeu, Dareon. Você disse as palavras. Você deveria ser
    meu irmão.
    — Em Westeros. Isto parece Westeros para você?
    — Meistre Aemon...
    — Está morrendo. Aquele curandeiro no qual você desperdiçou toda
    a nossa prata disse isso. — As palavras de Dareon se tornaram insuportáveis.
    — Pegue uma garota ou vá embora, Sam. Você está estragando o meu
    casamento.
    — Eu vou — disse Sam, — mas você vem comigo.
    — Não. Eu estou farto de você. Eu estou farto do negro. — Dareon
    arrancou o manto de sua noiva nua e jogou no rosto de Sam.
    — Aqui. Jogue esse pano sobre o velho, isso pode mantê-lo um
    pouco mais quente. Não vou precisar dele. Eu estarei vestido em veludo em
    breve. No próximo ano vou estar vestindo peles e comendo... — Sam o
    atingiu.
    Ele não pensou nisso. Sua mão veio, enrolada em um punho e caiu
    na boca do cantor. Dareon xingou e sua esposa nua deu um grito, e Sam se
    atirou sobre o cantor e o jogou sobre uma mesa baixa. Eles eram quase da
    mesma altura, mas Sam pesava o dobro e pela primeira vez ele estava
    zangado demais para ter medo. Ele socou o cantor no rosto e na barriga, em
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    O Festim dos Corvos - Página 17 Empty Re: O Festim dos Corvos

    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:18 pm

    seguida começou a esmurrá-lo sobre os ombros com ambas as mãos. Quando
    Dareon agarrou seus pulsos, Sam o acertou com a cabeça e rasgou o seu
    lábio. O cantor o soltou e ele socou seu nariz. Em algum lugar um homem
    estava rindo, uma mulher xingando. A luta parecia ficar mais lenta, como se
    fossem duas moscas pretas lutando em âmbar. Então alguém arrastou Sam
    para fora do peito do cantor. Ele bateu naquela pessoa também e algo duro
    quebrou na sua cabeça.
    A seguir ele sabia que ele estava do lado de fora, voando de cabeça
    através do nevoeiro. Por um momento ele viu a água preta por baixo dele.
    Em seguida, o canal apareceu e esmagou-o no rosto.
    Sam afundou como uma pedra, como um bloco, como uma
    montanha. A água escura entrou em seus olhos e no nariz, fria e salgada.
    Quando ele tentou gritar por socorro ele engoliu mais. Chutando e ofegando
    ele rolou, bolhas estourando de seu nariz. Nadar, ele disse a si mesmo, nadar.
    A salmoura ardeu em seus olhos quando ele os abriu, cegando-o. Ele
    apareceu à superfície por um instante sugando o ar e bateu desesperadamente
    com uma mão enquanto a outra raspou na parede do canal. Mas as pedras
    estavam escorregadias e viscosas e ele não podia segurar. Ele afundou
    novamente.
    Sam podia sentir o frio contra sua pele à medida que a água
    encharcava suas roupas. Seu cinturão escorregou pelas suas pernas e ao
    redor dos seus tornozelos enroscados. Vou me afogar, pensou ele em um
    pânico cego. Ele se debatia, tentando escalar seu caminho de volta para a
    superfície, mas ao invés disso seu rosto bateu no fundo do canal. Estou de
    cabeça para baixo, ele percebeu, eu estou me afogando. Algo se moveu
    debaixo, uma mão abanando, uma enguia ou um peixe, deslizando por entre
    os seus dedos. Eu não posso me afogar, Meistre Aemon vai morrer sem mim,
    e Goiva não terá ninguém. Eu tenho que nadar, eu tenho que...
    Houve um enorme splash, e algo se enrolou em torno dele, sob seus
    braços e em volta do peito. Uma enguia, foi seu primeiro pensamento, uma
    enguia me pegou. Ela vai me puxar para baixo. Ele abriu a boca para gritar,
    e engoliu mais água. Estou me afogando, foi seu último pensamento. Oh,
    deuses, sejam bons, estou me afogando.
    Quando ele abriu os olhos estava deitado de costas e um grande
    negro das Ilhas do Verão estava apertando em sua barriga os punhos do
    tamanho de pernis. Pare com isso, você está me machucando, Sam tentou
    gritar. Em vez de palavras ele vomitou a água e engasgou. Ele estava
    encharcado e com frio, deitado na calçada em uma poça de água do canal. O
    homem das Ilhas do Verão socou sua barriga de novo, e mais água veio
    esguichando do seu nariz.
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    O Festim dos Corvos - Página 17 Empty Re: O Festim dos Corvos

    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:18 pm

    — Pare com isso — Sam engasgou. — Eu não me afoguei. Eu não
    me afoguei.
    — Não. — Seu salvador inclinou-se sobre ele, enorme, negro e
    gotejando. — Você deve a Xhondo muitas penas. A água estragou capa fina
    de Xhondo. — Deivo mesmo, Sam percebeu. O manto de penas se agarrou
    aos ombros enormes do homem negro, encharcado e sujo.
    — Eu não queria...
    — ...nadar? Xhondo viu. Muita água espirrada. Homens gordos
    devem flutuar. — Ele agarrou as mãos de Sam com um punho preto enorme
    e o colocou de pé. — Xhondo é ajudante no Vento de Canela. Muitas línguas
    ele fala, um pouco. — Xhondo riu por dentro, por ver você socar o cantor.
    — E Xhondo ouve. — Um largo sorriso branco espalhou-se por seu rosto. —
    Xhondo conhece esses dragões.
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:19 pm

    Jaime 470


    Esperava que por esta altura que você já estivesse farto
    dessa deplorável barba. Todos esses pelos deixa você
    parecido com o Robert. — A irmã colocou de lado o luto
    em prol de um vestido cor de jade com mangas de renda de Myr prateada.
    Uma esmeralda do tamanho de um ovo de pombo pendia-lhe do pescoço
    num fio de ouro.
    — A barba de Robert era preta. A minha é dourada.
    — Dourada? Ou prateada? — Cersei arrancou um pelo abaixo do
    seu queixo e ergueu-o. Era grisalho. — Está perdendo a cor, irmão. Você se
    transformou num fantasma do que você era, numa coisa pálida e aleijada. E
    tão exangue, sempre de branco. — Desfez-se do pelo com um piparote. —
    Prefiro você vestido de ouro e carmesim.
    Eu prefiro você sarapintada de luz do sol, com gotículas de água na
    pele nua. Desejava beijá-la, levá-la para o quarto, atirá-la na cama… ela
    anda fodendo com Lancel e Osmund Kettleblack e o Rapaz Lua…
    — Vou propor negócio. Liberte-me deste dever, e a minha navalha
    estará às suas ordens.
    A boca dela se apertou. Havia tomado vinho quente com especiarias
    e cheirava a noz-moscada.
    — Você ousa discutir comigo? Tenho que relembrar que jurou
    obedecer?
    — Jurei proteger o rei. O meu lugar é a seu lado.
    — O seu lugar é onde quer que ele ordene que você esteja.
    — Tommen coloca seu selo em todos os papéis que você põe na
    frente dele. Isto é obra sua e é uma loucura. Para quê nomear Daven o seu
    Protetor do Oeste se não tem confiança nele?
    Cersei sentou-se junto à janela. Por trás dela, Jaime conseguia ver as
    ruínas enegrecidas da Torre da Mão.
    — Por quê tanta relutância, sor? Perdeu a coragem com a mão?
    — Prestei um juramento à Senhora Stark de nunca mais pegar em
    armas contra os Stark ou os Tully.
    — Uma promessa de bêbado feita com uma espada na garganta.
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    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:19 pm

    — Como poderei defender Tommen se não estiver com ele?
    — Derrotando os seus inimigos. O pai sempre disse que um golpe
    rápido de espada é uma defesa melhor do que qualquer escudo. Admito que
    a maior parte dos golpes de espada precisam de uma mão. Apesar disso, até
    um leão mutilado pode inspirar medo. Quero Correrrio. Quero Brynden
    Tully agrilhoado ou morto. E alguém tem de pôr Harrenhal nos eixos. Temos
    necessidade urgente de Wylis Manderly, assumindo que ainda está vivo e
    cativo, mas a guarnição não respondeu a nenhum dos nossos corvos.
    — Quem está em Harrenhal são homens de Gregor — lembrou-lhe
    Jaime — A Montanha gostava deles cruéis e estúpidos. O mais provável é
    que tenham comido os seus corvos, com mensagens e tudo.
    — É por isso que vou mandar você para lá. Podem comer você
    também, valente irmão, mas confio que você causará indigestão. — Cersei
    alisou a saia. — Quero que seja Sor Osmund que comande a Guarda Real na
    sua ausência.
    … ela anda fodendo com Lancel e Osmund Kettleblack e o Rapaz
    Lua, pelo que sei…
    — Essa escolha não pertence a você. Se eu for, Sor Loras ficará aqui
    no comando em meu nome.
    — Isso é algum gracejo? Sabe o que eu sinto por Sor Loras.
    — Se não tivesse mandado Balon Swann para Dorne…
    — Preciso dele lá. Os dorneses não são dignos de confiança. Aquela
    serpente vermelha foi campeã de Tyrion, você se esqueceu disso? Não
    deixarei a minha filha à mercê deles. E não terei Sor Loras ao comando da
    Guarda Real.
    — Sor Loras é três vezes melhor homem do que Sor Osmund.
    — As suas noções de virilidade mudaram um pouco, irmão.
    Jaime sentiu a ira a aumentar.
    — É verdade, Loras não te olha para as tetas como Sor Osmund, mas
    não penso…
    — Pensa nisto — Cersei esbofeteou-o.
    Jaime não fez qualquer esforço para bloquear o golpe.
    — Estou vendo que vou precisar de uma barba mais espessa, para
    me proteger das carícias da minha rainha. — Desejava arrancar-lhe o vestido
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    O Festim dos Corvos - Página 17 Empty Re: O Festim dos Corvos

    Mensagem  Admin Seg Jun 25, 2012 1:19 pm

    e transformar os golpes em beijos. Já antes o fizera, na época em que tinha
    duas boas mãos.
    Os olhos da rainha eram gelo verde.
    — É melhor que vá embora, sor.
    … Lancel, Osmund Kettleblack, e o Rapaz Lua…
    — Além de mutilado, você é surdo? Encontrará a porta atrás de
    você, sor.
    — Às suas ordens. — Jaime girou nos calcanhares e a deixou.
    Em algum lugar os deuses riam. Cersei nunca aceitara de bom grado
    ser contrariada, ele sabia disso. Palavras mais suaves poderiam tê-la feito
    mudar de ideias, mas nos últimos tempos bastava vê-la para sentir-se
    irritado.
    Parte de si ficaria contente por deixar Porto Real para trás. Em nada
    lhe agradava a companhia dos bajuladores e dos tolos que rodeavam Cersei.
    O pequeno conselho era como chamavam no Fundo das Pulgas, de acordo
    com Addam Marbrand. E Qyburn… podia ter salvo a vida de Jaime, mas não
    deixava de ser um Saltimbanco Sangrento.
    — Qyburn fede a segredos — dissera a Cersei, num aviso. Isso
    apenas a fez rir.
    — Todos nós temos segredos, irmão — respondera.
    … ela anda fodendo com Lancel e Osmund Kettleblack e
    provavelmente até com o Rapaz Lua, pelo que sei…
    Quarenta cavaleiros e outros tantos escudeiros o esperavam à porta
    dos estábulos da Fortaleza Vermelha. Metade eram ocidentais juramentados
    à Casa Lannister, os outros inimigos recentes transformados em amigos
    duvidosos. Sor Dermot da Mata de Chuva levaria o estandarte de Tommen, o
    Ronnet Connington, o Vermellho, a bandeira branca da Guarda Real. Paege,
    Piper e Peckledon partilhariam a honra de servir o Senhor Comandante como
    escudeiros.
    — Mantenha os amigos atrás de você e os inimigos onde você possa
    ver — aconselhara-o um dia Sumner Crakehall. Ou teria sido o pai?
    O seu palafrém era um baio sanguíneo, e o corcel de batalha um
    magnífico garanhão cinzento. Tinham-se passado longos anos desde a última
    vez que Jaime dera nomes a qualquer um dos seus cavalos; vira muitos
    morrer em batalha, e isso se tornava mais duro quando lhes eram dados
    nomes. Mas quando o rapaz Piper começou a chamá-los de Honra e Glória,

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